Indisciplina/Violência nas escolas

Com este artigo pretende-se fazer uma breve reflexão sobre a questão da violência em meio escolar. A violência em meio escolar têm sido ultimamente vivenciada nas nossas escolas, apresentando-se como uma fonte de stress nas relações interpessoais, particularmente quando associada a situações de conflito em sala de aula. Mas, além de constituir um “problema”, a violência na escola tem algo a dizer sobre o ambiente escolar e sobre a própria necessidade de um avanço pedagógico e institucional.
Algumas características da violência em meio escolar

A violência nas escolas não é um fenómeno estático que tem mantido as mesmas características ao longo das últimas décadas. Ao contrário, está “evoluindo” cada vez mais nas nossas escolas. Sob diversos aspectos, a violência escolar, hoje, diferencia-se bastante daquela observada em décadas anteriores. A violência escolar apresenta, actualmente, expressões diferentes, é mais complexa e “criativa”, e parece aos professores mais difícil de a equacionar e resolver de um modo efectivo.
Por exemplo, quando vários alunos de uma turma do ensino básico, mesmo formada por grupos divergentes entre si, são capazes de se organizar e estabelecer atitudes de indisciplina colectiva, que vão desde a prática de um mesmo tipo de tratamento evasivo durante as aulas de determinado professor, passando por estratégias para o intimidar ao ponto de o forçar a abandonar a sala de aula ou mesmo a escola, até processos complexos de contestação da orientação pedagógica dos docentes e da própria escola, torna-se de facto muito difícil equacionar ou mesmo resolver estas situações duma forma atempada e racional. Todavia, torna-se indispensável questionar qual o grau de participação da própria escola, da família ou mesmo do meio envolvente na geração de violência por parte de alguns alunos, e não apenas assumir-se uma posição simplista, sem a devida fundamentação, de que o problema da violência reside ou se origina sempre na atitude desses alunos.

O facto é que este aluno contestador, membro de uma sociedade cujos valores estão em constante mudança, onde o respeito pelo próximo já não é o que era, oriundo por vezes de meios sociais muito complicados ou de famílias desagregadas, não se conforma a aulas que considera “enfadonhas’, “desactualizadas”, “teóricas”, e olha muitas vezes o professor como um ser autoritário (porque não o deixa fazer o que quer), manifestando assim, o seu descontentamento, o qual precisa ser analisado para além do rótulo de indisciplina/violência, e ser pensado como expressão de uma consciência social em formação.
Contudo, se desejamos que tais alunos se tornem cidadãos de pleno direito, será necessário prepará-los (tarefa por vezes bastante difícil) para pensar e resolver conflitos, ou teremos uma violência com tendência para aumentar cada vez mais. Neste aspecto, o papel da família é crucial, devendo a mesma ser chamada a intervir e a responsabilizar-se pela educação dos seus educandos.

Causas da indisciplina/violência em meio escolar

Em relação à família, são vários os motivos que podem originar nos alunos actos de violência nas escolas:
Esses motivos estão muitas vezes ligados a:
- desagregação familiar: separações, mortes, consumo de drogas, prostituição, falta ou inversão de valores morais e éticos, desprestígio da educação, carência afectiva dos filhos;
- pais omissos: ausentes dos problemas escolares, coniventes com os erros dos filhos, não incentivando os estudos, não impondo limites aos filhos, jogando para a escola a responsabilidade da família;
- carências múltiplas: desemprego, miséria, exclusão social, falta de tempo para os filhos;
- falta de apoio psicológico e assistência social.

Esses motivos estão na maioria das vezes ligados a:
- falta de perspectivas, descrença nas instituições, desinteresse pela escola, falta de identificação com os professores e com a escola;
- interpretação errónea dos regulamentos internos das escolas (os direitos são geralmente valorizados em detrimento dos deveres), a não obediência às regras e normas de convivência, sentimento de impunidade, leis excessivamente permissivas, falta de padrões comportamentais positivos no grupo;
- dificuldades de aprendizagem, fracasso escolar;
- influência negativa dos meios média e banalização da violência;
- consumo de drogas e as más companhias;
- ociosidade das crianças e dos adolescentes associada à falta de projectos multi-disciplinares, extra-curriculares (prática de desportos, prática musical, exercício da solidariedade, trabalhos comunitários, etc...)

Os motivos geradores de indisciplina/violência podem estar ligados a: - falta de professores, faltas dos professores, falta de estímulo, descompromisso, baixos salários, carga horária excessiva de trabalho, formação deficiente, falta de habilitação, metodologias inadequadas, rotatividade excessiva, falta de treino e capacitação;
- falta de espaços físicos adequados para as actividades quotidianas.

- problemas com o sistema escolar: mudanças bruscas sem o prévio preparo, currículo desfasado da realidade, inadequado e restritivo, descaracterização da progressão/formação continuada, diminuição gradual da autoridade dos docentes, descaracterização, perante a sociedade, do papel do professor, centralização excessiva das decisões (nos órgãos superiores);
- Ministério da Educação pouco actuante ou agindo muitas vezes contra os interesses da escola e dos docentes.
A interferência da violência na qualidade do ensino

A violência interfere na qualidade do ensino porque:
- prejudica o clima indispensável à realização do processo ensino-aprendizagem;
- afasta alunos e professores dos projectos extra-classe;
- toma muito tempo útil aos Conselhos Executivos e aos professores;
- danifica o material didáctico, prejudicando o desenvolvimento das aulas e dos projectos; - consume verbas que poderiam ter melhor aplicação e que acabam
sendo gastas em consertos do património escolar ou recompras de material pedagógico;
- causa nos alunos: ansiedade, insegurança, queda na auto-estima, desinteresse, desmotivação, reacção de auto-defesa, apatia, agressividade e dificuldade de relacionamento;
- causa nos docentes: stress, medo, ansiedade, angústia, insegurança, desmotivação e sentimento de impotência;
- conduz alunos ao abandono escolar e à retenção, estimula a falta às aulas, gera intrigas e desrespeito,
cria situações de vexame constrangedoras para os alunos;
- prejudicar o relacionamento aluno/aluno, aluno/professor, aluno/órgãos da escola e escola/comunidade;
- prejudica as Horas de Trabalho Pedagógico Colectivas, dado que nas mesmas perde-se muito tempo a debater a indisciplina e a violência provocada por determinados alunos, ao invés de servirem para optimizar a execução do projecto pedagógico/educativo da escola.
Sugestões de prevenção em situação de violência na escola

A seguir apresentam-se algumas sugestões sobre encaminhamentos disciplinares preventivos ao nível de escola:
- as escolas devem desenvolver uma directriz disciplinar de base pedagógica ampla, legitimada pela comunidade escolar, consonante com seu projecto educativo. Tal directriz deve incluir o desenvolvimento de orientações (regras e procedimentos) disciplinares claras e de base ampla, as quais ganham em legitimidade à medida que são desenvolvidas com a participação dos estudantes, tornadas claras e conhecidas de toda a comunidade envolvida com a escola.
- a participação dos alunos é um elemento importante, pois favorece o sentimento de pertença e implica o exercício de algum grau de poder sobre as disposições colectivas, bases na criação de um senso de responsabilidade comum e um elemento de motivação.
– é necessária, ainda, uma disseminação ampla destas orientações comuns, que assegure que todos os estudantes, pais e profissionais da escola tenham claras as expectativas sociais e pedagógicas que estarão sendo praticadas pela escola.

- é importante ressaltar que tal directriz disciplinar não deve se restringir a estabelecer um conjunto de normas que organizem o ambiente escolar, mas deve também orientar a própria cultura daquilo que a comunidade deseja em termos de desenvolvimento disciplinar.
- esta política disciplinar deve partir de um conceito operacional claro quanto ao que considera “disciplina” e de um processo de reflexão através do qual se estabeleçam parâmetros disciplinares que estarão informando e norteando as estratégias e procedimentos a serem observados pela comunidade escolar.
- é importante, além disso, que essa directriz disciplinar combine encaminhamentos preventivos e interventivos, na forma de práticas de sala de aula em particular (que incluem a introdução, no currículo, de elementos para o desenvolvimento moral e aprendizagem cooperativa, por exemplo), tendo por complemento disposições disciplinares de base mais ampla, relativas à escola como um todo, e que sejam conhecidas e reiteradas pelos diversos profissionais que nela estejam actuando.
- um outro aspecto importante reside no cultivo de expectativas elevadas quanto ao desempenho escolar, socialização e comportamento dos estudantes. Se desejamos uma escola bem disciplinada é importante compartilhar e comunicar, aos estudantes, expectativas que reflictam uma apreciação quanto às suas potencialidades e que expressem a visão de que eles devem assumir as suas próprias responsabilidades junto da escola.
- outro elemento preventivo relevante está no ambiente da escola (que deve ser verdadeiramente humano, no sentido de constituir um espaço democrático onde se cultiva o diálogo e a afectividade humana, em que se pratica a observação e garantia dos direitos humanos (constitucionais). Este clima caloroso deve reflectir um conhecimento e preocupação quanto aos estudantes enquanto pessoas, tendo em vista as suas condições concretas, individualidades e singularidades.

- um outro aspecto refere-se ao papel do Conselho Executivo da escola. Parece particularmente importante que este seja “visível” e actue de modo a oferecer encorajamento e suporte a professores e alunos. A visibilidade aqui considerada diz respeito à presença constante do Conselho executivo nos diversos espaços da escola, onde deve exercer, de modo informal, relacionamentos com professores e estudantes, em nível pessoal e que expresse interesse pelas suas actividades. Também é importante a relação formal entre este órgão da escola e o corpo docente da mesma.
- aos professores deve ser delegada responsabilidade para lidar com as questões disciplinares de rotina; as questões mais sérias devem ser tratadas em parceria com as pessoas ou grupo responsáveis pela orientação disciplinar (pedagógica).
- é necessário, portanto, que os professores desenvolvam e conquistem maior autonomia para lidar com a indisciplina de sala de aula. Isto não significa deixá-los a sós com a indisciplina de sala de aula, mas fomentar um trabalho em parceria, baseado em responsabilidades claramente definidas e no auxílio estratégico em situações de intervenção da equipe de apoio pedagógico.
- por último, é preciso considerar a necessidade de estreitar as relações entre escola e o meio envolvente. Nesse sentido, uma meta a ser atingida seria ampliar o grau de envolvimento dos pais nas actividades para as quais são solicitados, seja nas discussões pertinentes às questões pedagógicas como às actividades extracurriculares ou mesmo de gestão, incluindo a questão da indisciplina. Para isso, é fundamental manter a comunidade informada quanto às metas, realizações e actividades escolares.
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